Da reflexão

Se os livros também servem para pensar e reflectir sobre as coisas, há livros que o fazem de forma especialmente interessante. Estes são dois livros que em nada estão relacionados e, contudo, quis juntá-los nesta pequena análise para explorar como um reflecte sobre o entretenimento e outro entretém através de uma reflexão inteiros que, de certa forma, é vedada ao leitor.

'As Aventuras de Sherlock Holmes' é um conjunto de pequenas histórias, que podiam muito bem ser isoladas, mas que em conjunto constituem episódios das vidas de Sherlock Holmes e do seu amigo Watson, narradas pelo segundo. Watson tem a sua vida já, é médico, casado e não vive no famoso apartamento 221B de Baker Street. No entanto, visita frequentemente Holmes e com ele segue as pistas que levam ao decifrar de inúmeros casos, que só um verdadeiro génio como o detective conseguiria resolver.

As histórias são fascinantes. Não assistimos propriamente à reflexão complexa de Sherlock perante os factos e à sua rápida percepção do que se passa, porque seguimos a visão de Watson. Só quando este, com quem nos identificamos por ser apenas um homem, sem a genialidade do amigo, o questiona sobre como chegou a determinada conclusão é que o nosso "Ah!" se junta ao de Watson e sorrimos com perspicácia do detective. Ler isto na expectativa do regresso da série Sherlock, então, foi do melhor. Imaginar o Benedict Cumberbatch em cada um dos casos era inevitável, por muito que goste do Robert Downey Jr.. A reflexão é overrated, quando Sherlock Holmes nos entretém de forma tão interessante.


Por seu lado, 'Amusing Ourselves to Death', de Neil Postman, é mais um dos livros ditos 'académicos' que tive o prazer de descobrir nesta saga de trabalhos que me deixou fora das lides da leitura de ficção durante algum tempo. É genial, também, à sua maneira, na comparação entre Orwell e Huxley, com visões tão distintas da realidade e cujo resultado podia ser o mesmo, que para Postman é o que hoje (nos anos 80, vá) observamos: a alienação do sujeito, o entretenimento das massas, a confiança cega e a falta de reflexão dos indivíduos perante um mundo em que tudo lhes dá prazer. O prazer cega, diz ele.

A tese é apocalíptica, negativista, mas não creio que fuja assim tanto da realidade. Postman reflecte, pensa demasiado, e demasiadamente de forma negativa, sobre o que observa. Generaliza, talvez, mas é bastante certeiro na sua crítica, ao mesmo tempo. E a forma como o faz, através de uma resenha histórica bastante precisa, reflectindo sobre o livro e a imprensa em contraste com o mundo televisivo onde o ver para crer é, também ele, sobrevalorizado, é super fascinante.

Dois livros para ler e deixar-se levar!

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